quarta-feira, 23 de março de 2011

A esperança é a última que morre.


  Eu era aquela rapariga estudiosa, meio tímida, mas que se dava bem com todos. Digamos até, que era a filhinha querida dos meus pais, não por ser a mais nova, mas por ser a mais "ajuizada". Os meus amigos, tal como eu, eram uns betinhos. Os estudiosos, bem comportados, intelingentes, cultos e nerds. Eu, que havia vivido naquela cenário desde que me lembro ter entrado na escola, começava a sentir-me cansada daquela vidinha de boa aluna, em que todos esperavam o melhor de mim. Já estava enjoada de olhar para a cara dos meus amigos, sempre a falar nas novas tecnologias, o novo antivírus para o computador... Enfim, aqueles com quem eu passava a maior parte do tempo, agora, tentava evitá-los. Esse meu ciclo irritante de vida repetia-se vez após vez, até o dia em que eu conheci o Guilherme. 
  Era um dia quente e o sol brilhava com toda a intensidade. Os meus amigos haviam combinado irem ao cinema ver um filme, mas eu, não estava mínimamente interessada em acompanhá-los, então, decidi ir passear sozinha, visto que todos iam ao cinema menos eu. Decidi ir à praia, não estava um dia óptimo para tomar banho, visto que estavamos em Abril, mas tudo bem. O cheiro a maresia e a praia meio deserta seria o ideal para repousar e pôr as ideias em ordem. Apanhei o autocarro e desci mesmo ali, em frente à praia. Tal como eu imaginara, estava quase deserta. Tanto melhor! Sentei-me na areia, estava quente por causa do sol, mas mesmo assim aconchegante. O meu olhar perdia-se no orizonte, como o mar era belo! Não sei como, mas dei por mim a pensar na minha vida nestes últimos anos. Eu, era uma rapariga de 19 anos que estudava direito, a minha vida era boa, tinha uma família que me amava... Então, porque me sentia tão incompleta?
  A meio dos pensamentos, eis que surge um rapaz ao meu lado, e, faz-me abondonar rápidamente o meus pensamentos. O seu cabelo era curto, era moreno, tinha olhos verdes, lábios bem deliniados, corpo esbelto, mas mesmo assim atlético e aparentava ter a mesma idade que eu. Uma criatura do sexo oposto capaz de tirar o fólego a qualquer mulher. Depois de um longo silêncio, eis que o oiço pronunciar algumas palavras:
- Nunca tinha te visto por aqui. - Disse ele, em tom sereno. - Ah! Desculpe a minha indelicadeza senhorita, me chamo Guilherme.
- Ah, não há problema. - Menti. O que eu queria era ficar sozinha. - Prazer Guilherme, chamo-me Joana.
- O seu nome é muito bonito. - Afirmou - O que a trás por  cá nesta altura do ano?
- Simplesmente tinha saudades do mar e da paz deste local. - Declarei, com um pequeno sorriso.
Foi uma tarde cheia de conversa, conhecemo-nos, trocamos ideias, opiniões. E no final, trocamos contactos. Não sei como nem porquê, mas sentia-me bem na companhia dele. Dias depois, passávamos horas no msn a conversar, horas ao telefone, e mais recentemente, tinha começado a faltar às aulas para estar com ele. Aquela criatura encantava-me cada vez mais, dia após dia.
  Depois de um dia cansativo na escola eu estava decidida a ir para casa descansar, até ao momento em que o meu telefone toca:
- Oi Guilherme. - Disse eu, toda eufórica, esquecendo automáticamente o cansaço.
- Boa tarde meu amor, vim quero convidar-te para ires a um local comigo, aceitas?
- Claro, mas agora?
- Sim, porquê, algum problema?
- Não, não. Passas aqui ao pé da escola para me buscar então?
- Dá-me 10 minutos e estou ai. - Dito isto, desligou.
Ele veio buscar-me de mota, como já havia feito à várias vezes. Eu lá fui, toda feliz e ansiosa para ver aonde ele iria levar-me.
  Chegámos, era uma casa abandonada, que caia ao pedaços, num lugar que eu não sabia onde ficava. Saimos, e eu acompanhei-o sem perceber a razão pela qual eu estava ali. Entrámos e começamos a conversar, até que eu descobri que ele drogava-se. O meu espanto foi descomunal. Pior ainda, foi quando ele quis incitar-me a fazer o mesmo. Eu sabia o que eram drogas e qual era o seu efeito. Pensei e pensei. Resolvi aceitar, afinal, não seria assim algo que me mataria à primeira.
  Ele injectou-me a seringa e a sensação foi... De o mais alto nível de extase. Caí no chão a contorcer-me, estava alucinada.
  Acordei ali, ao lado dele, com a parte de baixo sem roupa, apenas coberta por um casaco. O efeito da droga havia passado. Acordei-o e disse para ele me levar a casa. Ó meu deus, os meus pais estavam preocupadíssimos. Escusado será dizer que o seremão foi descomunal.
  Eu tinha voltado à vida normal e dias depois comecei a sentir dores horríveis e insuportáveis. Liguei ao Guilherme, e perguntei o que era aquilo. E ele disse que eu precisava de outra dose para parar as dores. Como aquilo era insuportável, resolvi ir, paguei pela dose e injectei-a. Isto repetiu-se vezes sem conta, até que o meu dinheiro acabou e comecei a roubar a dos meus pais. Acabei por fugir de casa, e todo o dinheiro que eu tinha, ia para aquela substância.
  Envergonhada, não tive coragem de regressar a casa, e precisava de dinheiro para ir comprar novamente uma nova dose. Agora, só tinha uma hipótese. A prostituição. Eu não queria descer tão baixo, eu não queria.
Fui a casa num horário em que não estava lá ninguém. Tomei banho e pus um roupa sedutora e maquilhei-me. «Não acredito que estou a fazer isto!», pensei.
  Sai porta fora e fui para o meio da estrada. Eu não queria aquilo para mim. Juro que não. Sentei-me no passeio e pus a mão sobre a cabeça, eu não queria mais aquela vida. A dor e o arrependimento havia invadido o meu ser. De repente, senti a dor provocada pela falta de drogas. Tinha-me decidido, até podia morrer com dores, mas não me protituiria. Não sei como, mas desmaiei.
  Acordei, na cama do hospital, com médicos á minha volta, e com os meus pais no fundo do quarto com os olhos cheios de lágrimas. Propuseram-me tratamento e eu aceitei. Iria sair do vício, eu sei que ia.
  Meses depois, sai da clínica. Nunca mais vi o Guilherme, nunca mais consumi. As portas da felicidade e da liberdade, tinham-se aberto para mim. A vida tinha me dado outra chance, e eu ia agarrá-la com unhas e dentes!

                                                                     *** 61ª edição visual - Projecto Bloínquês

1 comentário:

  1. Intenso, seria a palavra que o definiria na minha opinião. Bem intenso.. Poderia ter explorado mais a imagem, mas a história, foi envolvente. O que lamenta é que isso realmente acontece em todos os lugares, mesmo parecendo um absurdo. Muito bom seu texto! Beijo

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